sexta-feira, julho 16, 2010

CATÁSTROFES NATURAIS: ESTAMOS PREPARADOS

De há uns tempos a esta parte, o mundo tem sido abalado por sucessivas catástrofes naturais geológicas (terramotos, tsunamis ou erupções vulcânicas) e climáticas (inundações, secas ou tempestades).
Nos últimos trinta anos, o número desses desastres naturais, em todo mundo, vêm aumentando a uma taxa média anual de 6%, e, só em 2008, foram responsáveis por mais de 236 mil mortes e US$ 181 biliões em prejuízos, segundo estimativas da ONU.

As chuvas torrenciais que devastaram o Estado do Rio de Janeiro (mataram quase 250 pessoas) e o sismo na China (fez pelo menos 400 mortos e 10.000 feridos) foram as últimas demonstrações da força inequívoca da natureza.
Ora, sendo um fenómeno global, capaz de atingir a qualquer um, desde os países mais desenvolvidos (furacão Katrina nos EU) até os mais pobres e vulneráveis (terramoto no Haiti), interpela-nos a todos.
A primeira coisa que se questiona é a origem desses fenómenos.
Para a academia, alguns desses desastres já são consequências do aquecimento global e das alterações climáticas, grande parte culpa do homem. No entanto, outros, os mais cépticos, acreditam que é a “natureza a funcionar”, e mais nada.
Entretanto, e já que esses desastres são inevitáveis, outras teses preferem colocar a tónica em como fazer para se prevenir e minimizar o impacto, como, p.e, um maior controle do crescimento populacional urbano, a aposta na qualidade das infraestruturas e das construções, a urbanização ou o ordenamento do território, etc.
Independentemente de tudo isto, uma certeza há: o fenómeno é real e está a tornar-se cada vez mais frequente, por conseguinte, qualquer país tem que se preparar para o pior, esperando sempre pelo melhor.
Quem acompanhou de perto o caso das cheias na vizinha e amiga ilha da Madeira, de certeza, deve ter questionado sobre a eventualidade duma catástrofe dessa natureza nas nossas ilhas (Deus queira que não!). Será que estamos preparados?
Se pegarmos no caso de S.Nicolau, que pôs a nu a fragilidade do país, a resposta, infelizmente, é: não! Digo isto, fundamentalmente, por duas razões.
Primeiro, tem a ver com a nossa política de ordenamento do território nos grandes centros urbanos.
Voltemos ao desastre na Madeira. Em todos os debates, os especialistas ouvidos foram unânimes em apontar o ordenamento do território, melhor dizendo a falta dele, como a causa principal pela dimensão da catástrofe.
Ora, se transpusermos essa discussão para a nossa realidade, a situação é, de longe, mais gritante.
Centremos na nossa capital. O que se assiste, hoje, na nossa capital é uma autentica “selvajaria urbanística”: construções clandestinas, casas nas encostas impedindo escoamento natural das águas pluviais, sistema de drenagem que não funciona (ou não existe), valas de escoamento das águas das cheias entupidas, etc.
O caso da Praia é deveras preocupante, não obstante o bom trabalho que tem sido feito pela equipa de Ulisses. O exemplo disto é a assinatura da convenção de financiamento (orçado em 698 mil euros) com da AIMF - Association Internationale des Maires Francophones - para a requalificação da encosta de Vila Nova que, aliás, vem na sequência do trabalho já feito a nível de limpeza das ribeiras e da construção e aberturas de novos canais de drenagens em algumas zonas de maior rísco (Fonton, Achadinha, Vila Nova, Cobon, etc.).
Contudo, parece que ainda falta muita coisa para ser feita. Ouvi, há dias, na RCV, o presidente da CMP dizer que “32% das construções da Praia, além de mal construídas, estão mal situadas (no lugar errado), e que são necessários, pelos menos, 600 mil contos para resolver o problema de drenagem na capital” (esta problemática mostra, mais uma vez, a importância do estatuto especial da Praia que parece adiado sine die).
O segundo aspecto que me inquieta é a fragilidade do nosso Serviço Nacional de Protecção Civil (SNPC), o parente pobre da segurança interna.
Salta à vista de todos, a falta de coordenação e de articulação entre todos os actores que lidam com a protecção civil (governo, câmaras municipais, bombeiros, delegacia de saúde, forças armadas, etc.) quando são chamados de emergência.
Quem é que nunca assistiu, ao vivo ou na TV, uma imagem caricata quando essas forças são chamadas para locais de catástrofes? Quem é que nunca assistiu, ao vivo ou na TV, cadáveres a serem removidos em carrinhas de caixa aberta, sem qualquer dignidade humana. Quem é que nunca assistiu, ao vivo ou na TV, a forma como trabalham os nossos mergulhadores em caso de buscas de corpos. Enfim, podia dar mais ene exemplos.
Grande parte dessa fragilidade é graças à afectação de recursos a esse serviço. Deixo aqui alguns números que me preocupam enquanto cidadão.
No orçamento de Estado de 2010 (www.minfin.gov.cv/or-amento/or-amento-do-estado-2010/index.php ou B.O, I Série - Nº 49, de 29 de Dezembro de 2009, pág. 98), o Ministério da Administração Interna, com um montante de 1,873,437,654 ECV, disponibiliza para o SNPC a módica quantia de 13,189,448 ECV. Ou seja, uma fatia de apenas 0,7% (menos de 1%). Só para que o leitor tenha uma ideia, ao Gabinete do Ministro é atribuído 20,267,673 ECV (53% mais do que orçamento do SNPC).
Ora pergunto: é razoável que se atribua tão pouco dinheiro a uma entidade que lida directamente com a vida e os bens das pessoas em detrimento, p.e, de despesas duvidosas e de mordomias de Gabinetes de Ministros?
Assim, não há serviço que aguente. É visível a boa vontade das pessoas que, no seu dia-a-dia, labutam nesse sector. Todavia, só “boa vontade” não chega. Precisam de mais recursos (técnicos, materiais e financeiros).
Entretanto, o SNPC apresentou, recentemente, uma plano de actuação a nível preventivo através de “elaboração de uma plataforma de riscos com mapeamento das zonas de risco para intervenções em caso de catástrofes”. Uma medida que veio em boa hora e que deve ser aplaudida.
Porém, só isto não chega. O SNPC precisa de muito mais para que o país possa estar muito mais bem preparado para enfrentar esses desastres naturais que, a qualquer dia, pode nos bater a porta.
No entanto, além do SNPC, todos nós somos chamados. E aqui não deve haver lugar, nem para o “apontar de dedos” e nem tão-pouco para a desresponsabilização, mas sim para a repartição de responsabilidades.
Ao Governo e às Autarquias, com a tutela do SNPC e de toda a politica de Ordenamento de Território, caberá, sempre, a maior parte.
A Ordem dos Engenheiros e dos Arquitectos, duas entidades com competências técnicas nos domínios da qualidade da construção civíl, na urbanização e no ordenamento do território, devem ter um papel mais activo, mais participativo, emprestando os seus know how.
A sociedade civil e a população em geral terão, também, a sua cota parte.
A começar por uma maior consciêncialização para o fenómeno das construções clandestinas que, além de serem um crime, põem em risco a vida das pessoas.
Mas, com pequenos gestos, como, p.e, não deitar papéis ao chão, limpar a nossa porta, não deitar lixo nas ribeiras e valas, etc, podemos, todos, dar um grande contributo.
Se agirmos desta forma, não tenho dúvida que estaremos mais bem preparados para enfrentar uma eventual catástrofe e, assim, minimizar as consequências que daí podem advir.
Até breve!

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